APENAS UMA DÚVIDA
Traduzo livremente da versão inglesa, porque me não foi possível ter à mão o original alemão:
«Apenas quem sabe pela fé que houve um homem que é Deus possui a bitola necessária para determinar a verdadeira natureza do homem.
Unicamente alguém como ele sabe exactamente porque é que não podemos descobrir o verdadeiro homem e o que lhe é próprio, se procuramos apenas o homem.
Só quando tivermos bem firme nas nossas mentes que o próprio Deus se fez homem, a dolorosa experiência da história se torna transparente no seu significado; só então percebemos que um mero monólogo consigo próprio, por belo e sublime que seja, não faz mais do que lançar o espírito humano no vazio.
Porque o homem é o diálogo encarnado com Deus; o diálogo cujas primeiras palavras são – e aqui está a força original de todo o humanismo -: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança.
Neste momento foi dado ao homem o poder de responder a Deus, mas apenas naquele que é as duas coisas – anthropos e Logos -, pois o homem só pode dirigir-se a Deus do modo como Deus lhe falou a ele próprio. Tudo o resto é apenas monólogo com os deuses, que são meros reflexos de si próprio. Deus ouve apenas a Sua própria Palavra.» (Hugo Rahner).
E trago para aqui este texto, não especialmente para alertar os pensadores europeus para o perigo que encerram propostas legislativas como a daquele grupo de parlamentares de Estrasburgo, que querem que se proiba o ensino do criacionismo nas escolas. O que, no último momento me empurrou para a transcrição deste parágrafo de uma obra de referência do pensamento ocidental contemporâneo foi a estranheza que me casou há dias o presidente de uma organização cívica que admiro desde a minha juventue.
Esta organização acaba de oferecer o seu contributo, com uma análise de grande qualidade, para o que podemos designar por regeneração da sociedade portuguesa. E aí se fala, entre outras coisas, da crise de valores.
Pois o seu presidente, numa entrevista a vários órgãos da comunicação social, fez questão de frisar que estes valores não têm nada a ver com a religião, seja ela qual for.
Fico sem saber de que valores se fala. Ou o que é que ele entende por religião.
Por outro lado, não se me tira da cabeça que este intelectual, por falta da linguagem adequada, não comunicou uma ideia importante, que era talvez a sua, mas que não pode exprmir-se assim, sob pena de nos limitarmos a aumentar o coro dos mestres da esquizofrenia e da incoerência que minam a cultura ocidental.
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